Claugildo de Sá
Professor universitário, pesquisador, historiador e mestre em educação pela Absoulute Christian University – ACU Orlando – Florida – EUA
Além daqueles dias tenebrosos, percorri a minha querida cidade de Palmópolis/MG, que foi uma entre tantas atingidas pelas fortes enchentes no Nordeste do estado de Minas Gerais, no Baixo Jequitinhonha. Alguns desses municípios pertencem ao “polígono da seca”, que há anos não recebia tanta chuva.
O Rio Jucuruçu que transbordou nas últimas semanas nasce na zona rural do município de Felisbugo, e vai levando suas ondas pela zona rural do município de Rio do Prado, banhando o distrito Vila Formosa e, em Palmópolis, invadindo os bairros Alvorada e Esperança, percorrendo o Bairro Nossa Senhora de Fátima (bode), onde suas águas se espalham intensamente.
Continua seu percurso pelo distrito Dois de Abril, dirigindo-se para a Bahia nos municípios de Jucuruçu, Veredas e Prado, do extremo sul da Bahia, despejando suas águas doces no Oceano Atlântico. Toda essa área, a devastação foi anômala.
Os seus primeiros habitantes desde os anos de 1910 viviam às margens do rio e não há história de que essa tragédia tenha ocorrido antes. A população nunca ou por tamanha catástrofe natural.
Segundo algumas pesquisas orais que fiz com Dona Júlia de Filozão e Chiquinho do Bode, em 1998 houve uma enchente, porém, de proporção muito mais leve.
Não obstante lembrar que naquela época talvez fosse impossível perceber qualquer destruição ocorrida como nos últimos dias. As casas foram arrastadas pela natureza, porque estavam construídas lá, no lugar do caminho do rio, já que as pessoas mais antigas tinham aquela região como uma lagoa, que aos poucos foi se aterrando e dando lugar a residências, campo de futebol e até mesmo um posto de saúde.
O que se tem na realidade é o paternalismo das autoridades políticas ao longo de décadas, que vem fechando os olhos para as invasões de áreas de grande perigo.
O Rio Jucuruçu já deixou saudades, com as suas enormes ingazeiras, de águas límpidas, onde os primeiros habitantes de 1910 aproveitavam de suas correntes d’água apenas para tomar banho, lavar roupas, lavar louças e cozinhar. A casa desses moradores eram poucas, e algumas delas possuíam distância do rio por já temerem as suas grandes correntezas.
A exploração ambiental surgiu já na década de 80, e se intensificou com a emancipação política do então distrito, quando as pessoas se sentiram no direito de construir às margens do rio. Essas águas não nos invadiram; fomos nós quem ignoramos que esse rio tem esse percurso.
O sentimento é de tristeza ao ver de perto aquela catástrofe natural. Felizmente, não houve perda humana, mas tive uma sensação de que a barragem de Mariana estava estourando outra vez.
Amanheci desolado e cansado, e ao mesmo tempo feliz por viver em uma cidade de cerca de 6 mil habitantes, de uma população extremamente solidária e de um povo que não perde a fé.
O que estava ao nosso alcance e de muitos foi amanhecer o dia daquela noite salvando pessoas, removendo mobília, ajudando no que nos era possível. O descontrole ambiental é uma ação de responsabilidade humana e, se não agirmos com rapidez e prudência, logo ocorrer-se-á novos desastres.