MEMÓRIA

Sarney seguiu plano de governo do presidente

Vice assumiu após a morte de Tancredo e governou com ministros escolhidos pelo presidente eleito

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José Sarney governou o país de 1985 até 1990, com a missão de honrar o legado de Tancredo Neves. O presidente tinha uma missão complicada, uma vez que começava sua gestão com uma inflação de mais de 220% ao ano, dívida externa comprometendo as receitas, recessão, desemprego, dentre outras heranças do regime militar.


Para piorar, o próprio Sarney ite que não conhecia o plano de governo de Tancredo e sequer conhecia a equipe do seu ministério, uma vez que tudo havia sido negociado por Tancredo. “Terminou que eu tive que assumir o governo naquele momento sem ter escolhido nenhum ministro, a maioria eu não conhecia, sendo vice-presidente, quer dizer, eu não participei do plano de governo que eles tinham elaborado”, disse Sarney em entrevista à Agência Câmara.


O primeiro ano foi empregado para construir a legitimidade do governo. A primeira tarefa do novo presidente foi aprovar um pacote de leis para remover o chamado “entulho autoritário” e assegurar os compromissos de campanha. Do ponto de vista da transição democrática, Aécio Neves acredita que Sarney honrou seu avô. “Ele cumpriu e cumpriu com louvor aquele que era o maior desafio do Brasil naquele momento, que não houvesse retrocesso institucional. O fato de ter convocado a constituinte, garantindo que a Constituição fosse debatida com absoluta liberdade, é um grande legado que o Brasil agradece”, afirma o deputado mineiro.


Porém, Aécio reconhece que do ponto de vista econômico, a situação era complicada para Sarney, uma vez que ele não tinha apoio popular para tomar medidas drásticas contra a inflação e a dívida. “Tancredo se preparou para tomar medidas muito duras no início, exatamente para reequilibrar o país e conseguir o equilíbrio fiscal necessário. O Brasil teria avançado 15 anos com Tancredo. Mas eu louvo e reconheço o papel do presidente Sarney, que nas suas condições fez muito mais do que alguns esperavam dele”, emendou.


Para o neto de Tancredo, a situação beligerante da política atual mostra a falta que o perfil do presidente faz ao país. “Infelizmente, hoje a política se transformou em um ringue, onde ataques e ofensas tomaram o lugar do diálogo, das construções em torno de projetos de interesse nacional. Nós vivemos um clima político muito pesado, o que mostra a falta que faz homens como Tancredo”, completou.

Artigo

O nome da transição democrática

Bertha Maakaroun


“(...) A Nação inteira comunga deste ato de esperança. Reencontramos, depois de ilusões perdidas e pesados sacrifícios, o bom e velho caminho democrático. Não há Pátria onde falta democracia (...)” Tancredo Neves discursava no Colégio Eleitoral. Naquele 15 de janeiro de 1985, acabara de ser eleito o primeiro presidente civil após 21 anos do golpe de estado de 1964, que retirou do brasileiro o direito de eleger o presidente da República, proibição que depois se estenderia para governadores, prefeitos de capitais e um terço das cadeiras do Senado. Tancredo marcava ali o ponto de inflexão da transição democrática: era o primeiro o para a Assembleia Constituinte, que substituiria as Cartas autoritárias impostas nos anos de chumbo.


Não fora uma eleição fácil no colégio eleitoral. Aliás, foi uma construção que se iniciara em 1982, quando Tancredo se elegera governador de Minas pelo PMDB, numa dura disputa contra o candidato do regime militar, Eliseu Resende (PDS), que tinha o apoio do então governador mineiro lino Pereira (PDS), “eleito” por colégio eleitoral ao cargo em 1978 e do Palácio do Planalto, comandado pelo general João Baptista Figueiredo. Naquele pleito, Tancredo Neves – que se tornaria o primeiro governador de Minas eleito por sufrágio universal após 1965 – já mirava no horizonte a articulação de consenso em torno de seu nome, como saída negociada para pôr fim ao ciclo dos generais presidentes no país.


E não apenas Tancredo. Também Paulo Maluf, ex-governador de São Paulo, que sonhava em derrotar Carlos Andreazza em disputa futura pela indicação do PDS para concorrer à presidência da República no colégio eleitoral interno. Se Eliseu Resende derrotasse Tancredo ao governo de Minas naquela eleição de 1982, Andreazza sairia fortalecido. Tal tese foi revelada pelo jornalista Jorge Bastos Moreno, no livro “A História de Mora – a Saga de Ulysses Guimarães” (Editora Rocco/2013).


Tancredo Neves tomou posse à frente do Executivo mineiro em 15 de março de 1983 e governaria por pouco mais de um ano, até agosto de 1984, quando deixou o cargo para se dedicar à costura de votos no colégio eleitoral de janeiro de 1985, que elegeria o futuro presidente da República. A campanha pelas Diretas Já, encabeçada por Ulysses Guimarães da qual participara Tancredo Neves, em torno da Emenda Dante de Oliveira (PEC 5 /1983) fora derrotada em 25 de abril de 1984, mas ela unira o país em manifestações gigantescas nas ruas e praças. A opinião pública se mobilizava amplamente em favor de apressar o enterro da ditadura militar, afundada num governo sem transparência, de galopante inflação combinada à estagnação econômica. Do “milagre econômico” restara o pesadelo de longos anos de exceção.


Para vencer a disputa à Presidência da República Tancredo Neves – nome que se firmara na oposição e era palatável ao regime militar, pela capacidade de diálogo e articulação – precisava de votos. Não de cidadãos eleitorais – que seguiram-se mobilizados em todo o país –, mas de integrantes do colégio eleitoral: deputados federais, senadores, e delegados de cada Assembleia Legislativa dos estados.


Era preciso quebrar a unidade política do regime militar, capitaneada pelo PDS. E as oportunidades surgiram, dada a guerra interna no PDS pela indicação do regime na disputa à Presidência da República. A começar pelo vice-presidente da República, o mineiro Aureliano Chaves, aspirante frustrado à indicação, ando pelo então senador pelo Maranhão José Sarney, que era do PDS. Das dissidências no PDS – que mais tarde dariam origem ao Partido da Frente Liberal (PFL) em coligação com o PMDB – principal legenda de oposição ao regime militar – nasceu a Aliança Democrática.


Da capacidade de Tancredo de conciliar e ceder, a maioria do colégio eleitoral foi alcançada. Ulysses Guimarães colocava o problema nesses termos, quando buscava convencer aliados do PMDB, resistentes ao nome de José Sarney: “Não dá, aritmeticamente falando, para elegermos o Tancredo sem os votos da Frente Liberal, que, como contrapartida, ganhou o direito de indicar o vice – e indicou. Ou você acha que devemos deixar o Maluf eleger-se?” (“Moisés, codinome Ulysses Guimarães – Uma biografia”, de Luís Gutemberg).

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Tancredo Neves nunca tomaria posse. À véspera da data, foi internado às pressas no Hospital de Base de Brasília, para aquela que seria uma cirurgia de rápida recuperação. Mas um erro de diagnóstico de apendicite supurada e uma operação de emergência desnecessária, tumultuada pelo “espetáculo” aberto à cena política – com diversas lideranças acompanhando presencialmente.


Foi uma sucessão de atos médicos temerários que provocaram danos ao paciente e o levaram à morte. “Eu não merecia isso”, foi uma das frases pronunciadas por Tancredo Neves, paciente terminal e artífice da transição democrática, ouvida por vários médicos em 12 de abril, no Incor, antes de ser sedado definitivamente. Fechou os olhos para o mundo preocupado com a ala da linha dura do regime militar: a transição democrática se completaria ou seria abortada, seguiu sendo a grande inquietação até o último suspiro.

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