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PROTESTO

Moradores na rota de obras do metrô pedem clareza

Famílias que serão removidas para a implantação da linha 2 do modal de BH ocupam trecho onde são colocados os trilhos para cobrar informações sobre as indenizaç

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“A gente não sabe nada: para onde vai, como vai, como vai ser.” Mais de dois anos depois de anunciada a remoção de famílias para a construção da linha 2 do metrô de Belo Horizonte, moradores que vivem no traçado das obras continuam imersos em incertezas. Ontem (17/3), um grupo de cerca de 30 pessoas ocupou as obras na Avenida Amazonas em protesto. Eles desconhecem prazos e condições da desocupação, enquanto, segundo relatos, negociações são conduzidas individualmente, e resultam em propostas de indenização muito abaixo do valor dos imóveis. Realidade que se repete nos bairros Gameleira, Nova Gameleira, Nova Cintra, Betânia, Vista Alegre e Barreiro, onde nem mesmo o número exato de afetados parece ter consenso.


À sombra das estruturas inacabadas do metrô, os moradores que ocuparam o canteiro de obras, organizados pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e acompanhados pela deputada estadual Bella Gonçalves (Psol), reivindicaram o reassentamento e um espaço à mesa de negociação onde suas vozes possam ser ouvidas. “Querem colocar como se os moradores não quisessem o metrô, mas não é isso. A gente sabe que o metrô é necessário, que a cidade precisa dessa obra. O que queremos é que a gente saia de forma digna. A gente não sabe nada: para onde vai, como vai, como vai ser”, afirma Amanda Leles, de 35 anos, moradora da Rua Um, no Bairro Vista Alegre, na Região Oeste de BH, e uma das representantes das famílias. Em nota, a concessionária Metrô BH, responsável pela istração do transporte, manifestou preocupação com a segurança das pessoas por ser um canteiro de obras.


Na rua onde mora Amanda, que corre paralela à Avenida Teresa Cristina, discretos adesivos colados nos portões ou paredes das casas são um aviso constante do futuro incerto. Essa é a marcação feita pela Metrô BH de que esses imóveis terão que ser removidos para a expansão do metrô da capital, projeto aguardado por décadas, que irá conectar a Estação Nova Suíssa ao Barreiro. A identificação, sem qualquer informação concreta, no entanto, foi colada há mais de um ano e até hoje os moradores não têm clareza sobre o que os espera.

Negociações individuais

As remoções, conforme o planejamento de obras, divulgado pelo Estado de Minas à época da concessão do modal, estão previstas para ocorrer conforme o avanço das obras. Mas, para os moradores, a ausência de um cronograma claro alimenta a insegurança e a angústia. Ao longo do último ano, protestos e manifestações se multiplicaram. A pressão por um plano de reassentamento se intensificou em dezembro, quando os moradores estabeleceram o dia 18 daquele mês como prazo máximo para a Metrô BH apresentar uma solução concreta. O prazo ou, as respostas não vieram.

Amanda conta que o processo de remoção foi apresentado em quatro etapas: identificação dos imóveis – etapa que, segundo os moradores, fica marcada pelo adesivo colado nos portões –, pesquisa socioeconômica, selagem das casas e, por fim, pagamento das indenizações. Mas, na prática, as definições não avançaram. Agora, eles dizem que a empresa começou a realizar despejos individualmente. “Teve um morador que fechou acordo e saiu, mas ninguém sabe quanto ele recebeu. Já outro teve que sair às pressas porque a casa estava abalada, sem tempo para negociar nada, sem apoio. Agora ele está pagando aluguel”, explica Amanda.

Há relatos de vizinhos que receberam propostas de indenização consideradas irrisórias, como R$ 15 mil, que, na avaliação de Amanda, mal cobre o valor do material de construção, e ainda desconsidera o impacto social da remoção. “O que você faz com 15 mil reais hoje? Não dá pra comprar um imóvel, muita gente aqui não tem condições de bancar um aluguel”, questiona. “Eles (a concessionária) estão fazendo uma propaganda enganosa, falam que estão sendo transparentes com as famílias, mas não temos notícias, nenhuma atualização”, completa.

Procurada pela reportagem, a Metrô BH reafirmou que o mapeamento, a selagem das casas que serão desocupadas e o perfil socioeconômico das famílias foi traçado após entrevistas, apesar de a desapropriação mão ter começado. A concessionária não respondeu aos questionamentos sobre quando o processo de remoção deve ter início.

Perda de comércio

Há mais de 15 anos à frente de um pequeno comércio, Geraldo Bruno Correia, de 48, sente o peso da indefinição. Além da própria casa, teme perder o sustento da família, a “vendinha” que abriu na Rua Um, e recebe clientes fiéis todos os dias. "O que a gente sabe até agora é que eles vão realmente indenizar o pessoal, mas não falam quanto nem quando. Já são mais de dois anos dessa conversa, e a gente está nessa confusão", diz.

A mudança forçada também impõe desafios logísticos à família. Diferente de uma casa, que pode ser substituída por outra moradia, um ponto comercial depende de uma série de fatores, como ressalta Geraldo. “Comprar um imóvel, se você tiver dinheiro, não é difícil. Mas formar um ponto, criar uma clientela, isso não acontece do dia para a noite. Aqui trabalha todo mundo junto. É o que sustenta a nossa família inteira”, reforça.

Para ele, a remoção representa um rompimento brusco com anos de história e trabalho. “Se a gente tivesse certeza de que iam pagar um valor justo, que desse pra comprar outro imóvel e recomeçar, menos mal. Mas o problema é essa quase certeza de que vão pagar uma mixaria. E tem a questão do ponto comercial. Será que vão indenizar melhor? Pelo menos pra cobrir um pouco do prejuízo?”, questiona. Além disso, há o impacto sobre os funcionários, que perderão seus empregos, e sobre os trabalhadores informais que dependem do comércio local.

A também comerciante Lucélia Gomes de Oliveira, de 38, reforça a fala de Geraldo. Para ela, dinheiro nenhum compensa a perda do lugar onde construiu sua vida. "Se não fosse o metrô, se alguém falasse assim: 'Olha, eu te dou um milhão pelo ponto', a gente não pegaria. Não tem preço. É onde moramos, onde trabalhamos. Como você simplesmente larga tudo?", questiona. “A gente não sabe como é que vai ser. Não é só um negócio, é algo que representa muito pra gente”, acrescenta.

Para Ana Paula dos Reis, de 43, a preocupação se soma à responsabilidade de criar os filhos. Mãe de cinco, ela viu todos crescerem ali, em meio ao barulho constante dos trilhos do trem, “como se ficassem no quintal de casa”. A mais velha já tem 20 anos, enquanto os mais novos, de 9, 10 e as gêmeas de 5, ainda dependem da rotina que ela estabeleceu na região. Agora, vive em um misto de apreensão e desinformação. “Geralmente, eles conversam com outras pessoas, e eu acabo sem saber direito como anda essa situação”, diz.

Por mais que tente não pensar no assunto, Ana Paula não consegue evitar o medo do que pode vir. “Fico imaginando, porque tenho filho. Não sei como vai ser, pra onde a gente vai. Eles cresceram aqui, já estão acostumados. A escola é perto, o comércio também. É um bom lugar para morar”, afirma.

Números divergentes

O número de famílias atingidas pelas desapropriações também é motivo de controvérsia. A Metrô BH estima que 349 imóveis precisarão ser desocupados, mas levantamento feito pelos moradores indica um impacto maior, com mais de 650 famílias afetadas. As divergências surgem porque muitas residências abrigam mais de uma família. "Esse número é maior. Tem casa que tem três famílias, duas famílias. Nem isso é avaliado de forma justa", explica Amanda. E, para essas pessoas, a indenização considera o imóvel como se houvesse uma única família.

Em notas anteriores publicadas pelo EM, a Metrô BH afirmou que as edificações foram construídas “por meio de invasão”, argumento que, segundo os moradores, pode ser usado para reduzir o valor das indenizações. Além disso, eles denunciam que a empresa iniciou despejos individuais sem garantir moradia adequada para as famílias removidas. Questionada pela reportagem, a concessionária não respondeu a acusação até o fechamento desta matéria.

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No mês ado, o chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Márcio Macêdo (PT), se reuniu com a deputada estadual Bella Gonçalves e com moradores impactados. No encontro, na sede da prefeitura, representantes das famílias afetadas pediram a intervenção do governo federal, principal financiador da obra, para garantir tratamento digno às pessoas que irão perder suas casas. O ministro se comprometeu a acompanhar a situação. Bella Gonçalves, que tem atuado no caso, encaminhou, ano ado, a questão ao Centro de Autocomposição de Conflitos e Segurança Jurídica do Ministério Público de Minas Gerais (Compor).

Cronograma acelerado

As obras da linha 2 do metrô avançam ao longo da Avenida Amazonas. No início de fevereiro, uma visita técnica reuniu representantes da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), da Metrô BH, da VLI e da MRS na Estação Amazonas para acompanhar o progresso da construção. O Governo de Minas Gerais e a concessionária garantem que estão empenhados em acelerar o cronograma para que a linha 2 comece a operar antes da previsão oficial, que, conforme o contrato de concessão, é março de 2029. A expectativa é de que o serviço esteja em funcionamento em 2028, atendendo aproximadamente 300 mil pessoas.

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