Leão da Lagoinha: 77 anos de folia e um desfile para Cosme e Damião
O grupo que fez história no carnaval de Belo Horizonte mantém tradição e abre alas para os blocos caricatos
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Siga noO ponto de partida do primeiro bloco de Belo Horizonte segue sendo o mesmo desde os anos 1940: o cruzamento das ruas Itapecerica e Machado de Assis, na Lagoinha, Região Noroeste da capital. Foi dali que, às 15h desta segunda-feira (3/3), a bateria vermelha e dourada do Leão da Lagoinha iniciou mais um cortejo, embalando foliões com marchinhas clássicas e homenagens às raízes afro-brasileiras.
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Este ano, a celebração se volta para Cosme e Damião, santos que, no candomblé, são associados a Ibeji, os orixás gêmeos filhos de Iansã e Xangô. A devoção vira festa no batuque, nas fantasias e na energia que faz o Leão atravessar gerações sem perder a majestade. Mais tarde, às 18h30, o Leão ainda terá a missão de abrir oficialmente o desfile dos blocos caricatos e das escolas de samba de Belo Horizonte.
Fundado em 1947, quando Belo Horizonte ainda engatinhava no Carnaval de rua, era ele quem dava o start na folia belo-horizontina e recebia a chave da cidade, muito antes da criação da Corte Momesca. E a tradição segue viva. Quando o Leão pisa na rua, o grito ecoa entre os foliões: "O Leão voltou, o Leão voltou!".
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Para Adélia Mendes, rainha do bloco e testemunha viva dessa trajetória, o Leão da Lagoinha é mais do que um desfile: é uma herança da comunidade. "Todo mundo participando, aquela brincadeira mesmo de comunidade. Os mais velhos desciam para a avenida, mas nós, crianças, não podíamos acompanhar. E o bloco foi crescendo, muita gente foi aderindo, achou bonito, engraçado", relembra.
Adélia cresceu dentro do bloco. Seu pai, que tocava na bateria, ajudou a fundar o Leão com amigos do futebol, movidos pela vontade de criar uma festa popular. "A gente era muito carente, né? Mas se juntava para fazer acontecer. Inclusive tem até um livro aqui da Lagoinha, onde tem a foto dele com o pessoal, com a turma", diz, orgulhosa.
À frente do desfile, com a responsabilidade de carregar e reverenciar o estandarte do bloco, que praticamente não mudou em 77 anos de história, está Eduisa Rodrigues. Designer de moda, ela chegou ao Leão em 2019, primeiro como foliã, depois como porta-estandarte – um sonho de infância realizado.
"Eu já gostava muito do carnaval, vem de família. Meu avô era carnavalesco em Itambacuri e meu pai ajudava. Desde criança eu brincava de porta-bandeira, então estar no Leão, um bloco tradicional, com essa representatividade, é uma alegria imensa", conta.
Foi por meio de um grupo de afroempreendedores que ela conheceu o bloco. Na época, desenhou a fantasia da musa do desfile e decidiu também participar. No ano seguinte, veio o convite para carregar o estandarte. De lá para cá, já são cinco anos de dança, força e simbologia à frente do cortejo.
"É um bloco que a gente vai com raça, com coragem e com representatividade. O carnaval tá aí para isso: para manifestar, brincar e representar", afirma.
No meio da bateria, as vozes do bloco fazem a trilha sonora do desfile. Regia Lopes, de 62 anos, faz parte do vocal há dois anos e se diz honrada em participar do bloco. "O Leão já tem uma tradição muito respeitosa, que não tem como ser menor", diz.
Para ela, estar no bloco é mais do que cantar: é carregar a história da própria cidade. "A Lagoinha é a história de BH, principalmente a musical, tudo começou aqui." Depois do desfile, ela ainda segue para o Unidos do Guarani, escola de samba do grupo de o. "A gente sempre sai com vibrações positivas, esperando ganhar".
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Já Juh Nogueira, de 53 anos, encara hoje sua primeira experiência no Leão. Moradora de Rio Acima, na Grande BH, ela chegou ao bloco quase por acaso e foi arrebatada. "Está sendo muito emocionante. Faço parte de um coletivo de mulheres cantoras e tudo aconteceu muito rápido. Dali veio o convite para participar do Leão", conta.